Pena mais alta, de 27 anos e três meses, foi para o ex-presidente Jair Bolsonaro, considerado o líder da organização criminosa
A Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) concluiu na noite desta quinta-feira (11) o julgamento da Ação Penal (AP) 2.668 com a fixação das penas para os oito réus condenados pela tentativa de golpe de Estado. Eles integraram o Núcleo 1 da tentativa de golpe, conforme denúncia da Procuradoria-Geral da República (PGR).
Além das penas privativas de liberdade (prisão), também foram cláusulas multas para sete dos réus. Todos também foram condenados a pagar, de forma solidária, uma indenização de R$ 30 milhões por danos morais coletivos. O valor foi imposto a todos os condenados por envolvimento nos atos de 8 de janeiro de 2023.
Ao propor as penas, o relator da ação, ministro Alexandre de Moraes, disse que uma sanção deveria ser aplicada na medida necessária para evitar futuras tentativas de golpe. “A reprovação e a prevenção da dosimetria da pena devem ser feitas para desencorajar a tentativa de obstruir a manutenção da normalidade democrática no país e afastar a ideia de que é fácil a quebra do Estado de Direito para poder se perpetuar no poder, independentemente da vontade popular e do respeito às eleições livres e periódicas”, afirmou.
O resultado das penas foi o seguinte:
Mauro Cid (réu-colaborador), tenente-coronel e ex-ajudante de ordens de Jair Bolsonaro
Dois anos de reclusão em regime aberto; restituição de seus bens e valores; extensão de benefícios da colaboração para pai, esposa e filha maior; e ações da Polícia Federal para garantir a segurança de colaboradores e familiares. A pena foi estabelecida em seu acordo de colaboração premiada.
Jair Bolsonaro, ex-presidente da República
27 anos e três meses de pena privativa de liberdade em regime inicial fechado e 124 dias-multa (cada dia-multa no valor de dois períodos mínimos à época dos fatos).
Walter Braga Netto, general da reserva, ex-ministro da Casa Civil e da Defesa
26 anos de pena privativa de liberdade em regime inicial fechado e 100 dias-multa (cada dia-multa no valor de um salário mínimo à época dos fatos).
Anderson Torres, ex-ministro da Justiça e ex-secretário de Segurança Pública do DF
24 anos de pena privativa de liberdade em regime inicial fechado e 100 dias-multa (cada dia-multa no valor de um salário mínimo à época dos fatos).
Almir Garnier, almirante e ex-comandante da Marinha
24 anos de pena privativa de liberdade em regime inicial fechado e 100 dias-multa (cada dia-multa no valor de um salário mínimo à época dos fatos).
Augusto Heleno, general da reserva e ex-chefe do Gabinete de Segurança Institucional (GSI)
21 anos de pena privativa de liberdade em regime inicial fechado e 84 dias-multa (cada dia-multa no valor de um salário mínimo à época dos fatos).
Paulo Sérgio Nogueira, general da reserva e ex-ministro da Defesa
19 anos de pena privativa de liberdade em regime inicial fechado e 84 dias-multa (cada dia-multa no valor de um salário mínimo à época dos fatos).
Alexandre Ramagem, deputado federal e ex-diretor da Agência Brasileira de Inteligência (Abin)
16 anos, um mês e 15 dias de pena privativa de liberdade em regime inicial fechado e 50 dias-multa (cada dia-multa no valor de um salário mínimo à época dos fatos).
A pena de Mauro Cid foi introduzida por unanimidade. As demais foram determinadas por maioria de quatro votos. O ministro Luiz Fux propôs uma pena menor para Braga Netto e deixou de votar na dosimetria quanto aos demais, pois havia votado pela absolvição.
Crimes
Com exceção de Ramagem, os demais sete réus foram condenados por crimes de tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito, golpe de Estado, participação em organização criminosa armada, dano qualificado e liberdade de patrimônio tombado. No caso de Alexandre Ramagem, a parte relativa aos fatos ocorridos após sua diplomação como deputado federal, em dezembro de 2022 (dano educacional e restrições de patrimônio tombado), está suspenso até o termo do mandato.
Outras punições
Por quatro votos, a Turma decidiu pela perda do mandato do deputado federal de Alexandre Ramagem e pela inelegibilidade de todos os réus por oito anos após o cumprimento da pena. Nos dois pontos, o ministro Luiz Fux deixou de votar.
Em relação a Alexandre Ramagem e Anderson Torres, a Turma determinou a perda do cargo do delegado da Polícia Federal. Fux também deixou de votar quanto a este quesito.
Para Jair Bolsonaro, Augusto Heleno, Paulo Sérgio e Almir Garnier, a Turma determinou, por unanimidade, que o Superior Tribunal Militar (STM) seja oficiado para analisar a Declaração de Indignidade para o Oficialato, que pode levar à perda de posto e patente militar. Este ponto não atingiu Mauro Cid, já que ele teve uma pena inferior há dois anos. A comunicação deverá ser feita após o encerramento da ação e o esgotamento de todos os recursos (trânsito em julgado).
Fonte: STF
(Lucas Mendes/CR//CF)
Related posts
1 Comment
Deixe um comentário Cancelar resposta


A Condenação de Bolsonaro e o seu Retorno ao Cárcere
A Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) condenou, na última quinta-feira (11/09/2025), por quatro votos a um, o ex-presidente Jair Messias Bolsonaro, apontado pela Polícia Federal como líder de uma organização criminosa. A pena foi fixada em 27 anos e 3 meses de reclusão, com início em regime fechado.
Nas preliminares processuais, a defesa alegou a incompetência do Supremo Tribunal Federal (STF) para processar e julgar o réu, acusado da prática de crimes como golpe de Estado e tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito. Argumentou que, por se tratar de ex-presidente da República, este não mais deteria prerrogativa de foro, nos termos do art. 102, I, “b”, da Constituição Federal de 1988.
Entretanto, o dispositivo constitucional invocado não prevê vedação expressa ao julgamento de ex-presidentes pelo Supremo Tribunal Federal. Nesse sentido, a Corte, no exercício de sua função típica de guardiã da Constituição, interpretou o alcance da norma constitucional e afastou a preliminar suscitada pela defesa, ao mesmo tempo em que reconheceu sua própria competência diante das particularidades do caso.
Diante de indícios de articulações contra o regime democrático e da conexão com outras autoridades detentoras de prerrogativa de foro, o STF conferiu tratamento especial à apuração dos crimes e levou o caso a julgamento. A Corte não cedeu a ameaças nem a pressões externas, garantiu o devido processo legal e aplicou o direito com a imparcialidade que se espera dos ministros do mais alto tribunal do país.
Em poucos dias, ou, no máximo, em poucos meses, o capitão reformado deverá retornar ao cárcere, onde já esteve preso por 15 dias na década de 1980. Naquela ocasião, o jovem Jair Bolsonaro foi condenado em primeira instância, mas recorreu e obteve a absolvição pelo Superior Tribunal Militar (STM), por 9 votos a 4, em sessão secreta, episódio detalhado em reportagem de Luiz Maklouf Carvalho, publicada no Estadão em 1º de abril de 2018. Diferente daquele julgamento, o processo atual foi público e permitiu que qualquer interessado acompanhasse tanto os trâmites quanto a decisão que culminou em sua condenação.
Com o julgamento concluído e a condenação confirmada, a expressão “acabou, porra!”, usada por ele em diversas ocasiões públicas, ganha agora um novo significado: não há mais recursos capazes de reverter a decisão do colegiado, resta apenas aguardar a ordem que marcará seu retorno ao cárcere, desta vez para o cumprimento da pena em regime fechado.
Apesar de o retorno ao cárcere ser apenas uma questão de tempo, após a publicação do acórdão (isto é, o texto completo da decisão), a defesa ainda poderá opor embargos de declaração. Trata-se de um recurso de alcance restrito, usado para apontar eventuais obscuridades, contradições, omissões ou erros materiais no acórdão. Ou seja, não tem o poder de alterar o que foi decidido, mas pode, na prática, atrasar a ordem de execução da pena.
Enquanto não ocorre o julgamento dos embargos de declaração, Jair Bolsonaro mantém o posto de capitão do Exército Brasileiro. Após o trânsito em julgado, a pena em regime fechado poderá acarretar a perda da patente, caso o Superior Tribunal Militar (STM) decida nesse sentido.
Após a publicação do acórdão dos embargos de declaração, a decisão do colegiado transitará em julgado. A partir desse momento, é bastante provável que os apoiadores do capitão manifestem insatisfação e considerem o resultado injusto. Os opositores, por sua vez, poderão reagir com ironia, usar frases populares como “está na hora de já ir”, e compartilhar memes e manifestações nas redes sociais.
O desfecho do processo mostra que, mesmo diante de pressões políticas internas e externas e de manifestações antidemocráticas de rua, o Supremo Tribunal Federal cumpriu com independência sua dupla missão institucional: proteger a Constituição Federal e assegurar a preservação do Estado Democrático de Direito.
Ailson Pinhão de Oliveira
Professor de Criminologia